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A gravidez pode explicar por que doenças autoimunes afetam mais as mulheres?

Durante a gravidez, o sistema imunológico recebe sinais para não atacar a placenta enquanto permanece alerta na proteção do corpo a agentes infecciosos. Mas o que acontece se uma mulher nunca engravidar?

01/07/2019

Nosso sistema imunológico deve nos defender de agentes infecciosos externos, mas, às vezes, algum fator faz com que ele ataque nosso próprio corpo e cause doenças conhecidas como “autoimunes”.

Os médicos já identificaram mais de 80 enfermidades desse tipo, como lúpus, esclerose múltipla, artrite reumatoide e Tireoidite de Hashimoto – e muitas delas são difíceis de identificar.

Elas também suscitam muitas perguntas, como, por exemplo, por que doenças autoimunes são mais comuns em mulheres do que em homens?

Nos Estados Unidos, por exemplo, cerca de 80% dos pacientes com esse tipo de doença são mulheres, segundo a Faculdade de Medicina da Universidade Johns Hopkins.
Não há consenso sobre as causas, mas em estudo publicado em junho na revista científica Trends in Genetics (Tendências da genética, em tradução livre), Melissa Wilson, bióloga evolutiva da Universidade do Estado do Arizona, e outros quatro pesquisadores apontam para “hipóteses da compensação pela gravidez” (PCH, em sigla do inglês).

Sinais da placenta
Durante a gestação, a placenta envia sinais ao sistema imunológico para que ele restrinja sua atividade e não identifique o feto como um corpo estranho a ser atacado.

Ao longo da história, o sistema imunológico das mulheres evoluiu para receber esses sinais e “facilitar a sobrevivência da gestante na presença de uma placenta invasiva e uma gravidez imunologicamente desafiadora”, escrevem os cientistas em seu estudo.

Ou seja, o sistema de defesa é “reprimido” para não atacar a placenta, mas, ao mesmo tempo, permanece alerta para continuar protegendo o corpo de agentes infecciosos.

Em cem anos, a taxa de gravidez caiu de uma faixa que variava entre 8 e 12 filhos por mulher para menos de uma criança em alguns países (no Brasil, segundo o IBGE, a taxa de fecundidade foi de 1,77 filho por mulher). Parte da queda é atribuída ao acesso crescente a métodos contraceptivos.

Mas o que acontece se o sistema imunológico permanecer anos esperando pelos sinais da placenta?

Sistema acelerado
A hipótese da equipe de pesquisadores é que, se a mulher não conceber ou desenvolver uma placenta que envie sinais, “o sistema imunológico pode se tornar agressivo demais, acelerado demais”, explica a revista Atlantic em um artigo sobre o estudo.

“Ele começa a procurar por coisas para atacar e que não sejam perigosas – essa é a maneira como as doenças autoimunes aparecem”, acrescenta.

Mas, segundo o estudo, a placenta ou a falta dela não são os únicos fatores que influenciam a incidência de doenças autoimunes.

A bióloga Melissa Wilson conta à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, que chegou ao conceito da “compensação da gravidez” ao estudar os cromossomos X e Y (aqueles que diferenciam o sexo). Ela notou que eles evoluíram ao mesmo tempo que a placenta em animais mamíferos.

“Tenho me perguntado por muito tempo se eles estão relacionados diretamente”, disse.

Os seres humanos têm 23 pares de cromossomos. O par de número 23 nas mulheres é XX e, nos homens, XY.

“O cromossomo X é o mecanismo genético que permite que haja diferenças sexuais também nas funções imunológicas”, explica Wilson.
Por ter dois cromossomos X, as mulheres podem ter doses únicas moduladas (de genes relacionados à imunidade) em comparação aos homens, explica Wilson, o que permitiria que o sistema imunológico da mãe respondesse à placenta.

“Acreditamos que o cromossomo X seja aquele modulador e que ele e a placenta podem explicar juntos as diferenças das doenças autoimunes em homens e mulheres”, diz a cientista

Ausência de fundamentação
Por outro lado, o cientista David Hafler, professor de neurologia na Escola de Medicina da Universidade Yale, nos EUA, afirma que a hipótese da compensação pela gravidez é promissora, mas ainda faltam dados que sustentem o conceito.

Wilson concorda com as lacunas apontadas. “Nossa hipótese é que mulheres que nunca engravidaram teriam um risco maior de sofrer de doenças autoimunes”, disse ela à BBC News Mundo. “E uma das coisas que gostaríamos de pesquisar, quando tivermos acesso aos dados, é se o número de gestações é usado para prever o risco de doenças autoimunes.”

Outro ponto da hipótese dos pesquisadores seria que as mulheres que não engravidam teriam um risco menor de ter câncer, “porque seus sistemas imunológicos permaneceriam altamente vigilantes ao esperarem pela placenta”.

De todo modo, ela afirma que a hipótese não implica que ter muitos filhos, como resultado da evolução, seja a melhor forma de agir. Segundo a bióloga, a pesquisa “não serve para nos dizer qual é o melhor caminho para uma mulher”, e sim para entender melhor as doenças autoimunes.

Fonte: G1

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