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Entenda como funciona a vacina da Pfizer contra a covid-19

Enquanto a Europa e os Estados Unidos sofrem com uma nova investida do Sars-CoV-2, consórcio Pfizer/BioNTech anuncia eficácia de 90% na vacina contra a covid-19. Os resultados são preliminares, mas foram recebidos com entusiasmo pela comunidade científica e pelo mercado de ações

Pela primeira vez, dados sobre a eficácia de uma vacina para covid-19 foram divulgados, com reações favoráveis da comunidade científica e das bolsas de valores no mundo todo. A norte-americana Pfizer e a alemã BioNTech anunciaram ontem que uma análise preliminar do estudo de fase 3 da substância que vem sendo testada em 43.538 pessoas — 2 mil delas no Brasil — teve eficácia “superior a 90%”. Isso significa que nove em cada 10 voluntários imunizados foram ficaram protegidos contra o Sars-CoV-2 com duas doses da vacina. Porém, especialistas lembram que os resultados não são os definitivos e que, como nenhum artigo científico foi publicado, faltam informações importantes, como a faixa etária dos participantes.

O anúncio foi feito pelo CEO da Pfizer, Albert Bourla, em um comunicado para a imprensa e os investidores. “Hoje (ontem), é um grande dia para a ciência e a humanidade. O primeiro conjunto de resultados do nosso ensaio de fase 3 da nossa vacina para covid-19 fornece a evidência inicial da capacidade em prevenir a covid-19”, disse, acrescentando: “Estamos atingindo esse marco crítico em nosso programa de desenvolvimento de vacinas em um momento em que o mundo mais precisa, com taxas de infecção atingindo novos recordes, hospitais quase excedendo a capacidade e economias lutando para reabrir.” Imediatamente após a divulgação da nota, as bolsas de valores do mundo todo passaram a operar em alta.

A vacina da Pfizer/BioNTech foi apresentada em 17 de março e, até agora, mais de 34 mil pessoas receberam as duas doses. Atualmente, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 11 imunizantes estão na fase 3 de testes, sendo que nove estão com resultados preliminares prontos, embora ainda não divulgados. No comunicado, Bourla afirmou que espera ter dados suficientes para publicar a análise em uma revista científica até dezembro. Ainda sem previsão para o lançamento comercial, a substância é cotada para entrar no mercado no primeiro semestre de 2021. O governo brasileiro não se mostrou interessado, até agora, em adquirir doses da vacina.

A análise divulgada ontem se refere a um grupo de 94 participantes do estudo e que desenvolveram a covid-19. Desses, 90% receberam placebo. Não mais que oito dos que adoeceram foram imunizados com a vacina de mRNA, protocolo que utiliza a sequência genética do vírus para ensinar as células a reconhecer e lutar contra ele.

Expectativa

O alto índice de eficácia da substância pode ser um “divisor de águas” na luta contra a covid-19, diz Sarah Kreps, pesquisadora da Universidade de Cornell, em Nova York. Recentemente, ela publicou um estudo na revista Jama Network Open, no qual revelou que, se o nível de proteção da vacina for equivalente ao da gripe — entre 50% e 60% —, a quantidade de norte-americanos interessados na substância não seria suficiente para atingir a imunidade de rebanho, que exige que ao menos 70% da população tenha anticorpos.

“Se os próximos dados confirmarem o resultado (de ontem), e a vacina tiver mesmo 90% de eficácia, o número de pessoas interessadas em se imunizar vai aumentar mais 10%, segundo nossas estimativas, aproximando do necessário para a imunidade de rebanho. Será um divisor de águas”, afirma Kreps. Citado pelo jornal inglês The Guardian, o pesquisador da Universidade de Oxford John Bell, que está envolvido com o desenvolvimento da vacina britânica, disse que a equipe da Pfizer atingiu um “nível incrível de eficácia”, e que isso poderia significar o retorno à normalidade já em março do próximo ano. “Sou a primeira pessoa a dizer isso, mas falo isso com alguma certeza”, declarou Bell.

Apesar das reações positivas, especialistas lembram que os dados são preliminares e podem mudar quando envolver um número maior de participantes. Faltam, por exemplo, informações sobre prevenção de casos graves, aqueles que levam à hospitalização e ao óbito. Também não se sabe a duração da imunidade provocada por ela. Em um estudo publicado em setembro na revista Nature, porém, os pesquisadores que desenvolvem a vacina da Pfizer informaram que a substância induz uma resposta robusta não só de anticorpos, mas de células de memória, capazes de reconhecer o vírus e lutar contra ele por muito tempo.

“Temos de levar em conta que foi um anúncio feito pelo presidente da empresa, não há publicação científica ainda, não há dados. É claro que dificilmente uma empresa desse porte seria irresponsável de divulgar uma inverdade. Mas precisamos de mais dados”, ressalta Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações. “É claro que a notícia é muito boa. Se os estudos seguintes confirmarem essa eficácia é bastante animador”, pondera.

Moscou divulga avanço

Embora o consórcio Pfizer/BioNTech tenha sido o primeiro a divulgar dados — ainda não publicados em revistas científicas — sobre um estudo de eficácia de fase 3, outros nove grupos de pesquisa têm informações semelhantes sobre suas vacinas, segundo um monitoramento da Organização Mundial da Saúde (OMS). Sem apresentar detalhes, a Rússia também anunciou, ontem, ter alcançado eficácia em seu imunizante.

Atualmente, 11 substâncias estão na fase de testes em que se investiga o potencial de proteger os imunizados contra a doença. No Brasil, além da vacina da Pfizer, são testadas a da Universidade de Oxford/Laboratório AstraZeneca e a Coronavac, da chinesa Sinovac que, entre outros lugares, é estudada em Brasília.

Por enquanto, nenhuma vacina recebeu autorização de distribuição comercial em grande escala, mas as autoridades chinesas deram luz verde para o uso emergencial de algumas das vacinas em desenvolvimento no país. Na Rússia, parte da elite política afirmou ter sido vacinada com o antígeno Sputnik V, que o governo espera implantar maciçamente nos próximos meses.

Até agora, nenhuma das vacinas de fase 3 apresentou problemas de segurança. A AstraZeneca e a Johnson & Johnson precisaram interromper seus estudos devido a intercorrências com participantes (um deles, brasileiro, morreu), mas comitês independentes concluíram que os problemas não tiveram relação com as vacinas. Inclusive, ocorreram com pessoas que estavam tomando placebo.

“Interromper por algumas semanas os estudos quando há ocorrências médicas com os voluntários passa uma mensagem muito importante para o público. Isso realmente demonstra como o sistema está funcionando e que estamos passando por avaliações de segurança”, comentou, em um painel científico para jornalistas, Edward Jones-Lopez, um dos pesquisadores da vacina da AstraZeneca.

Apesar de os estudos de fase 3 de 9 das 11 vacinas que se encontram nessa etapa estarem adiantados, o diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim), Renato Kfouri, pede cautela. “O tempo da ciência é longo. São resultados animadores, mas é impossível dizer quando teremos uma vacina pronta. Só político que dá prazo”, diz.

Trump e Biden comemoram progressos

O anúncio da eficácia de 90% da vacina da Pfizer/BioNTech foi recebido com entusiasmo nos Estados Unidos, que ontem chegou à marca de 10 milhões de infectados, segundo um balanço da Universidade de Johns Hopkins. Tanto o presidente norte-americano, Donald Trump, quanto seu sucessor, o democrata Joe Biden, eleito no último sábado, comentaram os dados sobre o imunizante. “O mercado financeiro sobe muito, vacina em breve. Informe 90% efetivo. Que grande notícia!”, tuitou Trump. Logo depois do anúncio otimista, o índice Dow Jones operou com alta de 5,63%. As ações da Pfizer subiram 11,51%.

Biden destacou que os dados são um novo sinal de “esperança”, mas alertou que ainda resta uma longa fase de estudos antes de a vacina ser comercializada. Já o renomado epidemiologista Anthony Fauci, diretor do Instituto de Doenças Infecciosas norte-americano, à frente da força-tarefa contra a covid-19, descreveu a notícia como “extraordinária” e lembrou que outra empresa farmacêutica, Moderna, utiliza uma técnica semelhante em seu projeto. “Isso dá esperanças para contarmos, inclusive, com duas vacinas”, afirmou, ao jornal The Washignton Post.

Fornecimento

Com base em projeções, a norte-americana Pfizer e a alemã BioNTech afirmaram que esperam fornecer 50 milhões de doses para todo o mundo ainda este ano e até 1,3 bilhão em 2021. Os Estados Unidos assinaram contrato para fornecimento de 100 milhões de doses. A Comissão Europeia fechou acordo em setembro para a compra de 200 milhões de doses, com opção de compra de 100 milhões de doses suplementares.

A Pfizer informou que está coletando dados para publicar um estudo científico dessa análise preliminar da vacina. “Esperamos compartilhar dados adicionais de eficácia e segurança para milhares de participantes nas próximas semanas”, disse o presidente da companhia, Allbert Bourla.

Alguns desafios técnicos podem ser um problema na logística de fornecimento da vacina, porém. Entre eles, o fato de ter de ser mantida a uma temperatura baixíssima, -70ºC. Também o regime de duas doses, com intervalo de sete dias entre elas, pode dificultar as campanhas de vacinação.

Fonte: www.correiobraziliense.com.br / postado em 10/11/2020 06:00

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