11/07/2018
A alergia alimentar infantil é um fenômeno que intriga médicos e cientistas. Acomete de 3% a 8% das crianças com menos de 3 anos de idade, segundo a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai), e não tem um medicamento específico para tratá-la, já que vários fatores podem estar envolvidos, dos hereditários ao potencial alérgico de alguns alimentos.
Pesquisadores americanos demonstraram que esses mecanismos também podem estar arranjados e, depois de experimentos com camundongos, montaram uma espécie de “combinação perfeita” para o surgimento da alergia. São quatro fatores envolvidos: uma genética que altera a absorção da pele, o uso recorrente de lenços de limpeza infantil, a exposição da pele das crianças a alérgenos na poeira e a vestígios de alimentos presentes em quem cuida delas.
“Essa é uma receita para o desenvolvimento de alergia alimentar. É um grande avanço em nossa compreensão de como a alergia alimentar começa cedo na vida”, ressaltou, em comunicado, Joan Cook-Mills, professora de alergia imunológica na Escola de Medicina Feinberg, da Universidade Northwestern, e principal autora do estudo, divulgado no Journal of Allergy e Clinical Immunology.
Para chegar à lista, a equipe usou evidências clínicas sobre alergia alimentar em humanos. Há pesquisas mostrando que até 35% das crianças com alergias alimentares têm dermatite atópica (Leia mais nesta página) e que a maioria dos casos ocorre devido a três mutações genéticas que reduzem a barreira de proteção da pele. Por isso, cobaias recém-nascidas foram modificadas geneticamente para ter as mutações e expostas a alérgenos alimentares.
Cook-Mills conta que se questionou sobre com quais elementos que causam a alergia alimentar os bebês teriam mais contato e como ele ocorreria. “Eles estão expostos a alérgenos ambientais presentes na poeira de casa. Podem não comer alérgenos alimentares por serem recém-nascidos, mas os estão recebendo na pele. Por exemplo, um irmão que come pão com manteiga de amendoim e beija o bebê no rosto, ou um pai preparando comida com amendoim e, logo em seguida, vai lidar com o bebê”, exemplificou a autora.
No experimento, os camundongos tiveram a pele exposta, de três a quatro vezes, a alérgenos alimentares e poeira. Cada contato durou 40 minutos e foi repetido ao longo de duas semanas. As cobaias também foram alimentados com ovo ou amendoim. Como resultado, apresentaram reações alérgicas no local da exposição da pele, no intestino e reação alérgica grave de anafilaxia, medida pela diminuição da temperatura corporal.
Sabão
Estudos sobre a limpeza da pele também inspiraram a equipe, principalmente os que relatam o efeito do sabão sobre o órgão ainda frágil dos bebês. “A camada superior da pele é feita de lipídios (gorduras), e o sabão nos lenços que geralmente são usados em recém-nascidos perturba essa barreira”, explicou Cook-Mills. Os camundongos foram expostos ao lauril sulfato de sódio, um sabão presente em lenços de limpeza infantis, e apresentaram reações alérgicas. Segundo os cientistas, a substância testada também está presente em cosméticos e produtos de higiene pessoal, como removedores de maquiagem, sais de banho e pastas de dente.
Segundo Cook-Mills, os resultados fornecem uma base para testar intervenções que poderão bloquear mais eficazmente o desenvolvimento de alergia alimentar em bebês e crianças. Além disso, as constatações evidenciam que boa parte desses fatores de risco pode ser evitada. “Reduza a exposição da pele do bebê aos alérgenos alimentares lavando as mãos antes de cuidar dele. Limite o uso de lenços que deixam sabão na pele. Tire o sabão usado com a água, como costumávamos fazer anos atrás. Essas podem ser uma ótima saída para evitar a exposição”, sugeriu a cientista.
A equipe dará continuidade ao trabalho, com novos estudos em animais. “O objetivo é determinar sinais únicos na pele que ocorrem durante o desenvolvimento da alergia alimentar. Isso levará a abordagens para impedir com segurança o desenvolvimento de alergia alimentar”, disse Cook-Mills.
“Podem não comer alérgenos alimentares por serem recém-nascidos, mas os estão recebendo na pele. Por exemplo, um irmão que come pão com manteiga de amendoim e beija o bebê no rosto”
Joan Cook-Mills, pesquisadora da Universidade Northwestern e principal autora do estudo
Fonte: www.correiobraziliense.com.br