Quando a Covid-19 surgiu como uma doença totalmente nova, muito se perguntou se a infecção causada pelo coronavírus seria do tipo em que os sintomas só aparecem uma vez, como a varicela (catapora), por exemplo. A resposta não demorou e logo no primeiro ano de pandemia os primeiros casos de reinfecção com quadros clínicos começaram a aparecer, mesmo que em eventos raros.
Apesar de o contágio promover uma defesa natural do organismo, garantindo proteção contra o vírus por um período de tempo, as reinfecções passaram a ser cada vez mais comuns à medida que novas variantes do Sars-CoV-2 surgiam, mesmo com a ampliação da cobertura vacinal entre a população, inclusive com doses de reforço. Então, o que explica isso?
É importante ressaltar que as vacinas são comprovadamente eficazes para reduzir significativamente casos graves e mortes pela doença, mas nenhuma é capaz de evitar totalmente o contágio pelo vírus, o que não anula a proteção conferida por elas e as mantém como principal aliada no combate à pandemia.
O geneticista Renan Pedra, professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), explica que a entrada do vírus no organismo não pode ser evitada, o que vale para qualquer patógeno desse tipo.
“Mesmo no caso da catapora, a pessoa pode ter outros contatos com o vírus ao longo da vida, mas não ter a manifestação clínica da doença, porque ela tem um nível de defesa grande o suficiente ou eficiente para neutralizar aquele vírus antes que ele consiga gerar a característica clínica que é esperada dele”, afirma.
Nesse sentido, é possível dizer que não é incomum a capacidade que o coronavírus tem de gerar novas infecções capazes de levar a quadros de Covid-19. O que há de novo, nesse caso, é que o Sars-Cov-2 tem causado novas reinfecções em espaços de tempo cada vez menores, segundo o geneticista.
“No início de janeiro, quando a onda causada pela Ômicron teve seu pico, começamos a discutir reinfecção, mas como a maioria era de pessoas que tinham sido infectadas pela Gama, eventualmente oito meses ou até um ano antes, era uma reinfecção que de certa forma já era esperada e era inclusive a razão de imaginar a necessidade de outras doses da vacina, porque a gente sabia que essa imunidade montada, pela vacina ou pela infecção natural, não era para a vida inteira”, afirma o especialista.
A Ômicron e suas variações, consideradas mais transmissíveis que as cepas anteriores, encabeçam as principais hipóteses sobre o aumento da frequência com que as reinfecções têm ocorrido, segundo o infectologista João Prats, da BP — Beneficência Portuguesa de São Paulo.
“A Ômicron foi campeã de reinfecções com casos leves, porque teve uma mudança importante das proteínas [do vírus], e o intervalo de proteção da vacina diminuiu. Muita gente procurou o consultório e perguntou por que estava com Covid de novo. É uma combinação de coisas: o tempo de duração da proteção é menor do que a gente esperava [das vacinas e da infecção natural], o surgimento de novas variantes, especialmente a Ômicron, e o tempo que demorou para revacinar [dose de reforço]”, explica o médico.
Recentemente, o Ministério da Saúde passou a recomendar a quarta dose da vacina contra a Covid-19 para pessoas com mais de 50 anos e profissionais que atuam na linha de frente dos serviços de saúde.
Apesar de o país assistir a um aumento progressivo das internações por Srag (síndrome respiratória aguda grave) causadas pelo coronavírus — que já correspondem a 70% das hospitalizações pela doença —, ainda não há uma previsão de que a segunda dose de reforço seja estendida à população em geral.
O geneticista Renan Pedra adverte que há uma subnotificação dos casos de reinfecção, o que pode contribuir para que a população pense no tema como algo incomum ou que afrouxe as medidas de proteção após a vacinação ou infecção natural.
“No Brasil temos uma dificuldade laboratorial muito grande de confirmar reinfecções e com os autotestes ficou ainda mais difícil. Então, na verdade, é muito mais comum do que a gente imagina, isso não tem absolutamente nenhuma dúvida”, afirma.
Os especialistas também destacam que não é possível comparar a frequência dos casos de Covid-19 com a de síndromes gripais causadas por outros vírus respiratórios.
Primeiro porque não há um padrão de incidência do coronavírus, isto é, não dá para dizer que ele é sazonal, como o influenza, que tem um pico esperado sempre no inverno.
“Vimos que passamos inclusive o verão com um número de casos de Covid-19 muito alto, então ainda não podemos prever nada. Talvez seja uma doença que não tem essa sazonalidade no ano e que, eventualmente, tenha um número de casos que pode ser menor do que estamos vendo agora, mas que sejam distribuídos uniformemente ao longo do ano”, afirma o geneticista.
Fonte: www.noticias.r7.com / Postado em 13/06/2022 – 02H00 (ATUALIZADO EM 13/06/2022 – 08H38)